Defender os direitos humanos é crucial para obter o “desenvolvimento com inclusão social”, tema da próxima Assembleia Geral da Organização dos Estados Americanos (OEA). Neste sentido, o trabalho realizado pelos defensores e defensoras dos direitos humanos no continente americano é essencial para o avanço dos princípios de liberdade, igualdade e justiça social que são intrínsecos à consolidação de sociedades democráticas.

Apesar disso, as defensoras, os defensores, suas organizações e familiares continuam, em muitos casos, pagando com sua própria vida, integridade e liberdade, entre outros.

A poucos dias da próxima Assembleia Geral da OEA, que ocorrerá em Assunção, Paraguai, de 3 a 5 de junho, os líderes das Américas devem renovar seu compromisso com o respeito e a proteção dos defensores e defensoras dos direitos humanos, e empreender ações para cumprir cabalmente suas obrigações já estabelecidas pelos órgãos do Sistema Interamericano de Direitos Humanos (SIDH).

No final de março, no marco do 150º período de sessões da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) da OEA, mais de 40 organizações – incluindo a Anistia Internacional – participaram de duas audiências temáticas sobre a situação das pessoas defensoras de direitos humanos. Nelas, evidenciamos que os assassinatos, as agressões físicas, as ameaças e as perseguições contra defensores e defensoras dos direitos humanos continuam sendo uma tendência preocupante na região.

Em 2013, somente na Colômbia, mais de 70 defensores e defensoras dos direitos humanos foram assassinados, incluindo dirigentes comunitários, indígenas e afrodescendentes. Em Honduras, desde o início de 2014 foram assassinados dois defensores dos direitos humanos que contavam com medidas de proteção da CIDH. No México, há poucos dias foi assassinada outra ativista dos direitos humanos. Em 12 de maio na cidade de Culiacán, estado de Sinaloa, foi morta a tiros Sandra Hernández. Ela lutava por verdade e justiça no caso de seu filho “desaparecido” e no dia estava se dirigindo para uma audiência na qual lhe dariam informações a respeito do caso.

Além dos riscos contra a vida, o sistema de justiça é usado frequentemente para restringir o trabalho de defensores e defensoras, para silenciá-los e minar sua credibilidade. Este é o caso, por exemplo, de Iduvina Hernández, uma das defensoras que participou destas audiências.

Hernández é diretora da Associação para o Estudo e a Promoção da Segurança na Democracia – SEDEM – e uma proeminente defensora cujo trabalho é focado em obter mecanismos e reformas para que as forças de segurança não cometam violações dos direitos humanos na Guatemala. Por seus esforços foi estigmatizada, perseguida e enfrenta acusações penais. Estas acusações estariam baseadas em supostos crimes cometidos quando ela era apenas uma menina.

Os ataques às liberdades de associação, expressão e reunião são outra preocupação constante em nível regional. O uso excessivo da força é usado com frequência para reprimir protestos sociais, por exemplo, no contexto de projetos de grande escala e questões sociais. Nos últimos meses e durante o ano de 2013, ocorreram vários protestos sociais no Brasil e na Venezuela, nos quais as forças de segurança responderam com uso excessivo da força, maus-tratos, detenções e violências.

Outra tendência é a estigmatização e ataques à reputação de defensores e defensoras. Também se têm usado normas restritivas para limitar seu direito à associação. Este é o caso da Fundação Pachamama no Equador, fechada arbitrariamente em dezembro de 2013 após uma decisão na qual não teve oportunidade de rebater as acusações ou defender-se e para isso foi usado um decreto executivo com regras amplas e ambíguas. Na República Dominicana, com a publicação de uma controvertida decisão da Corte Constitucional que priva, na prática, da nacionalidade dominicana as pessoas de ascendência estrangeiras e as converte em apátridas, no último trimestre de 2013 ocorreu um aumento de retórica hostil, ameaças e atos de intimidação contra pessoas de ascendência haitiana e os que defendem seus diretos humanos.

A situação das mulheres que defendem os direitos humanos também é preocupante. Como ficou evidenciado na audiência dedicada a este tema ante a CIDH, as defensoras, além de enfrentar riscos e agressões por seu ativismo, são objeto de discriminações e obstáculos pelo fato de serem mulheres. Em muitos casos, as agressões contra elas fazem alusão a sua identidade, tem um caráter sexual, colocam em dúvida sua moral sexual ou se focam na estigmatização de gênero. As defensoras também, em resposta a sua liderança ou ativismo, sofrem violência no ambiente familiar e comunitário, assim como agressões no interior dos movimentos sociais, o que aumenta suas situações de risco e limita suas redes sociais de apoio.

Também as pessoas que defendem os direitos das pessoas lésbicas, gays, bissexuais, transgênero e intersexuais (LGBTI) estão expostas a sofrer abusos e ataques. Frequentemente são percebidos como transgressores dos valores sociais e culturais. Devido à estigmatização e à exclusão, as defensoras e os defensores LGBTI frequentemente correm maiores perigos porque comumente têm negada a proteção e o reconhecimento como defensores legítimos.

Nesta situação de falta de proteção para defensoras e defensores de direitos humanos, temos evidenciado que o nível de impunidade é alarmante. São contados os casos nos quais as investigações terminam com a punição dos responsáveis: a maioria é arquivada por falta de impulso processual.

Neste sentido, é de vital importância que os Estados das Américas acatem os padrões já estabelecidos pelos órgãos do SIDH e reconheçam a legitimidade e importância fundamental dos que defendem os direitos humanos; garantam investigações efetivas dos ataques e agressões contra estas pessoas; estabeleçam salvaguardas processuais que evitem o uso indevido do sistema de justiça contra elas; e protejam de maneira efetiva, integral e diferenciada os defensores e defensoras em situação de risco, tendo em conta seu gênero, contexto e circunstâncias particulares.

Esta próxima Assembleia Geral da OEA abre uma nova oportunidade para que os líderes das Américas reafirmem seu compromisso com os direitos humanos, com o sistema que os protege e com a proteção integral dos que o defendem. Defender os que defendem os direitos humanos sem dúvida contribui para o desenvolvimento inclusivo. Por isso os Estados deveriam redobrar suas ações para acatar os padrões do SIDH nesta matéria.