No dia 14 de junho foi celebrado o décimo aniversário da adoção das Diretrizes da União Européia para os Defensores e Defensoras dos Direitos Humanos, na qual a UE e seus Estados membros se comprometem a apoiar e ajudar os defensores no marco da política de relações exteriores do bloco. Neste aniversário, a Anistia Internacional pede à UE e a seus Estados membros que façam um balanço da eficácia destas diretrizes e renovem seu compromisso de que elas representarão uma atuação significativa em apoio aos defensores e defensoras dos direitos humanos.
Os defensores dos direitos humanos são indivíduos, grupos de pessoas ou organizações que promovem e protegem os direitos humanos por meios pacíficos e não violentos, frequentemente com grande risco para si mesmos.
A Anistia Internacional está trabalhando com e para os defensores dos direitos humanos desde sua fundação, e considera que apoiar seu trabalho é uma das formas mais importantes de garantir os direitos humanos para todas as pessoas.
Os defensores dos direitos humanos podem trazer à luz violações de direitos humanos para submetê-las ao escrutínio público, pressionar para que as pessoas responsáveis prestem contas e empoderar indivíduos e comunidades para reclamar seus direitos básicos como seres humanos. Frequentemente, eles também são vítimas de violações de direitos humanos. Como consequência de seu trabalho, os defensores enfrentam uma série de dificuldades. Em muitos países, são submetidos à perseguição, ameaças de morte e tortura. Também são silenciados por leis restritivas e correm o risco de sofrer detenção arbitrária, sequestro, desaparecimento forçado e assassinato.
A UE e seus Estados membros, no âmbito do Marco Estratégico e do Plano de Ação da União Europeia sobre Direitos Humanos e Democracia de 2012, se comprometeram a intensificar o apoio político e econômico que prestam aos defensores dos direitos humanos e a redobrar os esforços da organização contra toda forma de represália. Ainda que nos últimos dez anos tenham sido realizados importantes avanços, a aplicação das Diretrizes continua sendo incoerente e falta transferência.
Neste décimo aniversário, é o momento de tomar medidas para aplicar de forma sistemática e coerente estas Diretrizes e lutar em prol de critérios mais elevados e uma maior profundidade de ação para apoiar os defensores de direitos humanos.
Algumas medidas concretas são:
· Definir com maior clareza as funções e responsabilidades das autoridades chave das representações e delegações dos Estados membros da UE em outros países.
· Garantir que as equipes da UE e seus Estados membros contem com um respaldo político claro, assim como com recursos e tempo para trabalhar em apoio aos defensores dos direitos humanos, e possam colaborar com eles na proteção destes direitos.
· Estabelecer indicadores mensuráveis que permitam a arrecadação de dados sistemáticos e a elaboração de relatórios transparentes.
· Ações diretas tais como a observação de julgamentos e as declarações públicas que são fundamentais para proporcionar apoio e visibilidade aos defensores dos direitos humanos. Tudo reforçado pela adoção de um enfoque sistemático e progressivo que busque maior transparência e prestação de contas sobre a forma como são aplicadas as Diretrizes na prática.
Ao mesmo tempo, a UE e seus Estados membros devem comemorar o décimo aniversário das Diretrizes reiterando publicamente seu compromisso em atuar na importante função que os defensores dos direitos humanos desempenham na proteção e promoção dos direitos humanos em todo o mundo. Também devem:
· Utilizar plenamente e de forma estratégica todas as ferramentas com que contam a UE e seus Estados membros para apoiar os defensores dos direitos humanos com medidas concretas, tais como enviar observadores a seus julgamentos e tornar visível seu trabalho mediante ações ou declarações públicas, tudo de forma proativa e em estreito contato com os próprios defensores.
· Atuar regularmente com uma ampla gama de defensores dos direitos humanos que trabalhem com direitos civis, culturais, econômicos, sociais e políticos nas diferentes áreas de países, incluindo zonas rurais e remotas.
· Utilizar diálogos políticos e de direitos humanos, assim como outros canais de comunicação, para recordar a terceiros países seu dever de proteger os defensores dos direitos humanos e garantir a inclusão dos defensores nestes processos.
· Proporcionar sistematicamente feedback público aos defensores, à sociedade civil e à opinião pública sobre a atuação da UE e de seus Estados membros sobre os defensores, fomentando um debate público significativo sobre a maneira de reforçar esta tarefa fundamental.
Defensores dos direitos humanos: apelos para a atuação da UE em todo o mundo
O preso de consciência Azam Farmonov, membro da organização independente Sociedade de Direitos Humanos do Uzbequistão, é o diretor da organização na região de Sirderia e filho de seu presidenteTalib Yakubov, que teve que sair do Uzbequistão em agosto de 2006, devido às constantes ameaças de morte que recebia e atualmente vive na França. Azam foi detido em 29 de abril de 2006 por defender os direitos dos agricultores locais que haviam acusado algumas autoridades agrárias do distrito de práticas indevidas, extorsão e corrupção Parece que foi torturado, acusado de extorsão e submetido a um julgamento no qual não teve advogado de defesa nem nenhum outro representante legal, e no qual foi condenado a nove anos de prisão. Azam Farmonov cumpre sua sentença no remoto campo penitenciário de Jeslik, situado a 1000 quilômetros de Guistão, onde vive sua família. Em seu relatório de fevereiro de 2003 sobre o Uzbequistão, o relator especial das Nações Unidas sobre a questão da tortura incluiu a recomendação de prestar atenção com urgência ao fechamento da colônia de Jeslik, que por sua mera localização gerava condições de reclusão que constituíam tratamento ou pena cruel, desumana ou degradante tanto para os reclusos como para suas famílias.
O Comitê de Familiares de Detidos Desaparecidos em Honduras ( COFADEH) é uma das principais organizações de direitos humanos de Honduras. O COFADEH foi criado originalmente para trabalhar sobre a questão dos desaparecimentos forçados no início da década de 1980. Atualmente trabalha com uma ampla variedade de questões de direitos humanos no país, entre elas, a impunidade pelos abusos contra os direitos humanos cometidos no passado, as ameaças e a perseguição contra defensores dos direitos humanos, o uso excessivo da força por parte da polícia e das forças de segurança, as questões relativas aos direitos sobre as terras e as condições nas prisões. O COFADEH também trabalha com organizações internacionais para sensibilizar sobre as violações de direitos humanos em Honduras, e desempenha um papel ativo na apresentação de casos de direitos humanos ante o Sistema Interamericano. Como consequência deste trabalho de defesa, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos ordenou ao Estado hondurenho que proporcione proteção a um grande número de defensores e defensoras dos direitos humanos hondurenhos. Os membros do COFADEH foram alvo de ameaças e perseguição no passado, mas em 2011 o número e a gravidade das ameaças e dos incidentes se intensificou. Entre fevereiro e abril de 2012, Dina Meza, membro da equipe do COFADEH e diretora do site de notícias da organização, recebeu uma série de ameaças de violência sexual. Foi informado também que desconhecidos a seguiram este ano em várias ocasiões, uma delas enquanto caminhava por uma rua perto de sua casa com seus filhos adolescentes e foram fotografados por dois homens desconhecidos. Outros membros do staff do COFADEH foram objeto de intimidação, vigilância e ameaças no contexto de um aumento generalizado de ataques contra defensores e defensoras dos direitos humanos e jornalistas desde o início de 2012.
Gao Zhisheng é um dos advogados de direitos humanos mais respeitados da China. Em 2005, o Departamento de Justiça Municipal de Pequim retirou sua permissão para exercer a advocacia e suspendeu as atividades de seu escritório de advogados, Shengzhi. Estas medidas foram consequência direta das cartas abertas dirigidas por Gao Zhisheng ao governo pedindo a interrupção da perseguição religiosa. Gao Zhisheng foi submetido a desaparecimento forçado, tortura, prisão domiciliar ilegal e detenção desde 2006, ano em que foi acusado do vago crime de “incitação à subversão” por suas atividades de direitos humanos. Atualmente está encarcerado na prisão da comarca de Shaya, no noroeste da China, após ser enviado para a prisão em dezembro de 2011, aparentemente por violar as condições de sua pena condicional de três anos. Ele será libertado em agosto de 2014. Antes de ser preso, esteve com paradeiro desconhecido durante quase 20 meses. Gao Zhisheng foi torturado repetidamente desde 2006, com golpes, descargas elétricas na genitália e cigarros acessos perto dos olhos. Continua correndo grande risco de tortura. Sua família fugiu da China depois da constante perseguição das autoridades.
Mohammad al-Qahtani é um proeminente defensor dos direitos humanos saudita, cofundador da Associação Saudita de Direitos Civil e Políticos em 2009, que foi condenado a 10 anos de prisão em março de 2013. Segundo os jornalistas e ativistas que assistiram ao seu julgamento, embora este fosse público, a grande presença de agentes de segurança à paisana impediu de fato que alguns ativistas de direitos humanos presenciassem o julgamento. A Anistia Internacional considera Mohammad al-Qahtani prisioneiro de consciência. A Associação Saudita de Direitos Civis e Políticos é uma das poucas organizações de direitos humanos independentes da Arábia Saudita e uma das mais ativas. Além de documentar violações dos direitos humanos e informar sobre elas, a Associação tem ajudado as famílias de muitas pessoas reclusas sem acusação nem julgamento a interpor ações contra o Ministério do Interior ante a Junta de Reclamações, tribunal administrativo com competência para ver demandas contra o Estado e seus serviços públicos. Mohammad al-Qahtani foi acusado dos seguintes crimes: infringir a lealdade ao governante, questionar a integridade das autoridades, difundir informação falsa entre grupos estrangeiros e criar uma organização não autorizada. A acusação de questionar a integridade das autoridades parece ter relação com ter acusado o judiciário de admitir confissões feitas sob coação. A de difundir informação falsa entre grupos estrangeiros parece referir-se ao mero fato de expressar suas opiniões sobre as violações dos direitos humanos cometidas na Arábia Saudita para meios de comunicação e organizações internacionais de direitos humanos. Mohammad al-Qahtani apelou em 28 de maio de 2013, mas sua sentença foi confirmada no início de 2014. Ele cumpre a sentença da prisão de al-Há’ir na capital, Riad, cujas condições penitenciárias havia denunciado.
A Campanha de Acesso a Tratamentos é uma destacada organização da sociedade civil que advoga para que as pessoas que vivem com HIV na África do Sul tenham serviços integrais de atenção à saúde. Seus membros, homens e mulheres, foram vítimas de ameaças e intimidações em diversas províncias da África do Sul. A frequência e gravidade de tais ameaças e incidentes tem variado conforme a região, mas durante os últimos meses foram denunciados vários casos graves. Em março de 2014, um líder da organização na província de KwaZulu-Natal foi vítima de uma grave agressão e outro, da província de Free State, recebe ameaças de morte desde o final de 2013. Fundada em 10 de dezembro de 1998 na Cidade do Cabo, a Campanha de Acesso a Tratamentos advoga por um maior acesso a serviços de tratamento, atenção e apoio às pessoas que vivem com o HIV e faz campanha para reduzir o número de novos casos de HIV. Conta com mais de 16.000 membros, 267 sessões e 72 funcionários que trabalham em período integral. Suas iniciativas, que incluem a apresentação de demandas, salvaram muitas vidas, como quando foram implantados programas nacionais para impedir a transmissão materno infantil do HIV e programas de tratamento com antirretrovirais em todo o país. A Campanha de Acesso a Tratamentos tem sido aclamada em todo o mundo e recebeu vários prêmios internacionais, inclusive a candidatura para o prêmio Nobel da Paz em 2004. A África do Sul tem o maior programa público de tratamento com antirretrovirais do mundo.